No artigo "Tirania Amiga", Vladimir Safatle mostra, através da última negociação de armas entra a Arábia Saudita e os Estados Unidos, o que há de falacioso nos critérios das potências capitalistas ocidentais - EUA, Inglaterra e França à frente - quanto ao seu auto-proclamado respeito aos direitos humanos. Traz mais uma importante argumentação para explicar a manipulação do tema como a razão para intervenções imperialistas onde bem aprouver aos interesses privados belicosos que seus governos representam. A Arábia Saudita, principal aliada dos EUA e de Israel, no Oriente Médio, recebeu autorização do Pentágono para mais uma negociação gigantesca de compra de equipamento militar, sem nenhuma discussão sobre a destinação e utilização, a despeito de todas as barbaridades anti-civilizatórias que a família Saud, proprietária do território por "generosidade", comete contra seu povo e contra povos vizinhos de ramos do islamismo distintos do sunita. É a chamada avaliação comercialmente seletiva. Aos capachos, tudo. Aos que ousam enfrentar e não se submeter ao imperialismo, a ocupação militar o ataque com drones. É a barbárie ocidental-cristã
Tirania Amiga
FSP 13/11/12
Uma das grandes razões pelas quais "democracia" é uma
palavra que significa muito pouco no Oriente Médio foi dada na semana passada.
Gostamos de ver países ocidentais como EUA, França e Inglaterra
como atores globais responsáveis que usam sua força para pressionar reformas
democráticas em países totalitários. No entanto eles mostram, na periferia do
mundo, como sua noção de "democracia" é, digamos, singular.
Semana passada, o Pentágono notificou o Congresso
norte-americano sobre o projeto de venda de US$ 6,7 milhões em equipamento
militar para a Arábia Saudita. Em 2010, os EUA fecharam uma venda recorde de
US$ 60 milhões em equipamentos, muitos deles utilizados para ocupar
militarmente o Bahrein a fim de esmagar revoltas que pediam padrões mínimos de
democracia.
O fato aberrante aqui é que a Arábia Saudita concorre cabeça a
cabeça com a Coreia do Norte para ser o país mais totalitário do mundo.
Monarquia absoluta teocrática sem partidos, sem Constituição,
sem Parlamento e sem nem sequer um simulacro de eleição, a Arábia é o país no
Oriente Médio que mais brutalmente trata as mulheres, não reconhecendo a elas
sequer o estatuto jurídico de pessoa autônoma. Seu sistema legal é tão arcaico
que adultério pode ser condenado com pena de morte.
Pode-se dizer que, contrariamente a países como a própria Coreia
do Norte e o Irã, uma Arábia Saudita forte-mente armada não representa ameaça a
seus vizinhos. Entretanto isso é falso.
Grupos salafistas que atuam na Tunísia e no Egito procurando
impor um Estado teocrático, usando métodos cada vez mais violentos, são
generosamente financiados pelos sauditas e pelo Qatar.
Por outro lado, desde a invasão do Kuwait pelo Iraque de Saddam
Hussein, nenhum outro país árabe havia mandado suas tropas para outro país
árabe, como fizeram os sauditas para defender a monarquia absoluta do Bahrein.
Ou seja, a Arábia é um polo de desestabilização de todo esforço democrático na
região.
Este é, juntamente com Israel, o mais fiel aliado do Ocidente na
região. Fato que demonstra a vacuidade do discurso dos direitos humanos quando
proferidos por antigas potências coloniais.
Em uma situação normal, o ato de armar os sauditas seria objeto
de revolta contra a ausência de limites da "realpolitik" da
diplomacia internacional. Ele seria a prova de que o tempo dos discursos vazios
sobre direitos humanos não passou. Pois ainda parece valer a lógica bem
descrita na suposta declaração de Franklin Roosevelt a respeito do ditador
nicaraguense Anastasio Somoza: "Ele pode ser um [palavrão impublicável],
mas é nosso [o palavrão de novo]".
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