Paulo Passarinho
Tudo indica, já
entramos na fase antecipada da campanha presidencial de 2014. Neste mês de
fevereiro, Dilma, Aécio, Eduardo Campos e Marina Silva claramente se movimentam
com os olhos voltados para outubro do ano que vem.
Mas, há
substantivamente alguma novidade a ser destacada no discurso dessas figuras?
Esta é uma indagação de difícil resposta, ao menos para a minha limitada visão.
Razões para uma nova proposta não faltam. Apesar da propalada e badalada
mudança nos rumos do país, nos anos Lula, o que mais assistimos é o mais do
mesmo.
Estruturalmente,
apesar da folga de nossas contas externas durante o período compreendido entre
2003 e 2007, não somente não aproveitamos essa oportunidade, como a partir de
então voltamos à perigosa trajetória de crescentes déficits nas transações
correntes do país. As bandeiras representativas para uma efetiva mudança nos
rumos do Brasil, em relação ao projeto que se desenvolve desde os anos 1990 –
mudança do tripé da política econômica; reforma tributária progressiva; reforma
fiscal em prol da federação, das despesas sociais e da infraestrutura
logística; reforma agrária e mudança paulatina do modelo agrícola, entre outras
-, foram abandonadas.
O lulismo
preferiu se fiar – além do apoio dos bancos, construtoras, multinacionais e
agronegócio – na capitalização política dos efeitos das medidas compensatórias
recomendadas pelo Banco Mundial – programas de transferência de renda aos mais
pobres, reajustes reais do combalido salário-mínimo e ampliação dos mecanismos
de crédito para a aquisição de bens de consumo.
Estas
iniciativas tiveram, de fato, um importante efeito minimizador das graves
consequências geradas e produzidas durante o segundo mandato de FHC
(1999/2002). Isto propiciou, politicamente, efeito positivo que se traduziu na
alta popularidade de Lula e na própria eleição de Dilma, em 2010. Mas, somente
os incautos ou oportunistas podem abstrair a perigosa trajetória que estamos
trilhando.
Gigante
rigorosamente adormecido, o Brasil de hoje é um país sem projeto próprio de
desenvolvimento ou soberania. Sob o ponto de vista produtivo, temos uma
economia desnacionalizada, uma indústria dominada pelas multinacionais, sem
nenhuma autonomia científica ou tecnológica (excetuando-se, talvez, o setor de
petróleo, graças à permanentemente atacada Petrobrás), e um modelo agrícola
baseado na importação de insumos, defensivos e sementes, utilizadas de sobremaneira
em monoculturas extensivas, voltadas para a exportação de commodities. A
expansão da renda e do emprego dos trabalhadores de baixa qualificação, somente
foi possível a partir de forte processo de endividamento do Estado, das
empresas e das famílias.
A fragilidade do
país é tamanha que até mesmo na área de serviços, tradicionalmente dominada
pelo capital nacional, o avanço do capital estrangeiro é notório e abrangente. Diferentes
setores são exemplos claros desse processo. Bancos, supermercados,
estabelecimentos de ensino, hospitais, planos de saúde e outros serviços
públicos essenciais ao dia-a-dia da população passam crescentemente às mãos de
“investidores” externos.
Dentre esses
serviços públicos essenciais, ganha destaque a infraestrutura logística do país.
Em meio à ofensiva privatista do primeiro governo de FHC – e apesar de já
estarem sendo entregues à iniciativa privada os setores de telecomunicações,
empresas de distribuição de energia elétrica, água e saneamento, entre outros setores
controlados por antigas estatais – a promessa e justificativa para tão
abrangente programa de desestatização era a necessidade de o Estado gerar
recursos para serem investidos na redução da dívida pública, nas áreas sociais
e na infraestrutura do país.
Apesar disso, o
que hoje assistimos é a explosão do endividamento público – comprometendo quase
a metade do Orçamento Geral da União com despesas financeiras -, a acelerada
degradação da qualidade dos serviços sociais públicos e a total incapacidade do
Estado em construir e manter adequadamente a infraestrutura logística do país.
Frente a essa
situação, pressionado pelas reduzidas taxas de investimento da economia
brasileira e o baixíssimo crescimento econômico nos dois primeiros anos de seu
governo, Dilma resolveu lançar um ambicioso programa de concessões e investimentos,
voltado para as áreas de portos, aeroportos, rodovias, ferrovias, hidrovias,
geração e transmissão de energia elétrica, petróleo e gás.
Os números
projetados pelo ministro da Fazenda, garoto-propaganda do pacote apresentado nesta
semana, em Nova York, a investidores, chegam a um montante anunciado de US$ 235
bilhões. Para os interessados, além de uma taxa real de retorno que será
superior a 10% ao ano (descontada a inflação), e de um prazo de duração dos
contratos ampliado, variando de 30 a 35 anos, o governo oferecerá crédito
subsidiado, em um montante correspondente entre 65% a 80% do valor dos
investimentos previstos.
Esta chamada
“alavancagem” será garantida pelo governo através do BNDES, e também através
dos bancos privados. Desse modo, para tornar ainda mais atrativo o negócio,
inclusive para os hiperlucrativos bancos privados brasileiros, o Tesouro
Nacional repassaria diretamente a esses bancos os recursos a serem emprestados
aos futuros interessados pelas concessões a serem feitas pelo governo.
Aos leitores que
se encontrem espantados ou perplexos com tanta generosidade do governo
brasileiro, há uma explicação adicional que é importante de ser conhecida. Para
a chamada formatação dessas propostas de concessões, o governo criou, em 2009,
uma empresa, a Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP), uma curiosa união do
BNDES com oito bancos com atuação no país: Banco do Brasil, Itaú, Bradesco,
Santander, HSBC, Citibank, Espírito Santo e Votorantim. É esta empresa,
portanto, que estabelece essas condições, para a continuidade da entrega da área
de infraestrutura do país a investidores privados e estrangeiros, sempre com a
providencial transferência de recursos do Estado para esses insuspeitos
interessados.
Infelizmente, nenhum
dos quatro possíveis postulantes à presidência da República, em 2014, citados
no início deste artigo, apresenta qualquer divergência relevante, em relação ao
modelo econômico em curso no Brasil. Apesar, inclusive, das permanentes e
artificiais alfinetadas entre tucanos e lulistas. Por isso, cabe a pergunta:
qual a razão para tanta precipitação? O que se disputa, a rigor, é apenas a
gerência de um projeto, pré-definido pelos interesses hegemônicos de bancos e
multinacionais.
A urgência, com
certeza, deve ser de outra natureza: a necessidade de um verdadeiro candidato à
presidente da República, com um projeto e plano de governo, dignos da
importância desse cargo e do real significado da palavra república.
28/02/2013