Num 26 de julho de 230 anos atrás, MAXIMILIEN DE ROBESPIERRE, o líder da fase proletária em que os Jacobinos hegemonizavam o poder na Revolução Francesa, era assassinado. Foi guilhotinado na sequência de um golpe promovido por girondinos, nostálgicos da monomaquia absolutista multissecular que havia sido extirpada pela República proclamada em 1792. Golpe que viria a consolidar o poder da burguesia sobre as camadas populares com as quais essa burguesia assentes já no período anterior, se aliara para dar fim ao absolutismo monárquico e proclamar a República. Revolução que então traia, impondo retrocesso legislativo brutal, com o desmonte das conquistas sociais estabelecidas na Constituição de 1793. Como primeiro ato desse retrocesso, uma nova Constituição marcada pelo fim do sufrágio universal direto, e restabelecimento do voto censitário.
RELEMBRAR ROBESPIERRE é fundamental nos tempos atuais, até por conta do ódio insuperável contra ele nutrido pelas classes dominantes da França e da Europa. Em Paris, onde o corrupto Danton é lembrado em praças centrais, nem as prefeituras socialistas admitiram aprovar projetos em que se dava nome de alguma rua a Robespierre. Somente nas prefeituras comunistas, ele recebe tal homenagem. E por que tanto ódio a esse desconhecido e pouco carismático advogado de Arrais, eleito para os Estados Gerais convocado por Luis XVI, na bancada do Terceiro Estado - que se opunha ao da nobreza e ao do clero ? Não é difícil compreender quando se faz balanço histórico do ódio e do desprezo dos segmentos privilegiados contra os despossuídos de qualquer sociedade.
ROBESPIERRE se afirmou rapidamente já mal chegado ao primeiro mandato, defendendo o sufrágio universal direto, a instrução gratuita obrigatória, e o imposto progressivo, em tempos onde nunca se havia falada em luta de classes. Em que Revoluções anteriores, nos Estados Unidos e na Inglaterra, mantinham sufrágio censitário controlado pelas classes dominantes, que tornavam inacessível aos de baixo chegar às casas legislativas.
PIONEIRO na luta pela abolição da pena de morte nas sanções judiciárias, é demonizado pelas classes dominantes também por conta da forma incisiva com que não hesitou em a ela recorrer no combate aos traidores da Revolução que se aliavam aos monarcas vizinhos na tentativa de impedir os avanços que a Revolução propiciava às camadas populares. O chamado período do Terror não nasce por conta de repressão dos de cima contra o povo trabalhador, ou dos resistentes aos regimes coloniais empregada pela burguesia quando vê seus privilégios ameaçados de forma contundente pelas demandas populares.
O TERROR na Revolução Francesa nasce contra os então poderosos que traiam o processo, e contra os quais a massa, em atos espontâneos, já vinha se manifestando de forma violenta. Foi um instrumento necessário na ordenação do período de transição entre o absolutismo e uma verdadeira República. Período em que a defesa dos novos valores impunha o confronto violento como alternativa à contra-revolução que nunca deixou de existir. De 1789 a 1792, quando a República é proclamada, e se completa o tríade famosa da Liberdade e Igualdade com o conceito de Fraternidade, viveu-se apenas uma monarquia constitucional. Onde os saudosistas do absolutistas transitando sem óbices. Com o Rei tendo poderes de veto, embora tivesse perdido a iniciativa autoritária anterior.
A CONDENAÇÃO À MORTE de Luis XVI, após a tentativa de fuga para se juntar aos monarcas estrangeiros, e obstada em Varennes, foi votada na Convenção e aprovada por maioria apertada. Mas, vale repetir, aprovada por voto e não decretada por um poder despótico. Decisiva foi, então, a intervenção de Robespierre onde ele declarava, diante dos que propunham julgamento pela Convenção transformada em tribunal, que o Rei já havia sido julgado quando da proclamação da República. Que os convencionais não poderiam se transformar em jurados em algo que, admitindo absolvição a despeito de todas as provas de traição à França e de cumplicidade de Luis Capeto com monarquias européias no sentido de restabelecer o absolutismo, resultaria na condenação da própria República. Robespierre conquistou aí os votos de boa parte dos moderados girondinos, isolando os nostálgicos da monarquia extinta.
É A PARTIR do "período do Terror" que a Revolução consegue barrar a sequência de derrotas do exército francês diante de tropas prussianas invasoras, repelindo-as e impondo--lhes vitória. Porque até então, antes da instalação do Comitê de Salvação Pública , boa parte da Convenção se entregava à idéia derrotista de acordo de rendição com os invasores. Foram os radicais, que assumiam aí rédeas do Estado, após expurgo dos girondinos que impuseram a virada salvífica contra os invasores e seus apoiadores internos.
POR QUE, então, um ano depois a Convenção se volta contra Robespierre? São vários os motivos cogitáveis. O rompimento com Hebert, líder dos "sais-coulottes"e sua condenação; o rompimento com corrupto Danton - que se acertava com a burguesia, inclusive com vantagens materiais - também entra nessa contagem. O bizarro nesse cenário, é que Robespierre teve que ser convencido pela maioria radical do Comitê que assumiu posição pelas condenações antes dele.
DE QUALQUER FORMA, é inevitável considerar Robespierre, líder dos Jacobinos, como Revolucionário exemplar. Que tinha clareza de encabeçar um processo onde não havia referências teóricas anteriores, e nem organicidade partidária ou sindical das classes trabalhadoras. Onde não havia sequer um proletiado expressivo, visto que a Revolução Industrial já em pleno vapor na Inglaterra, era incipiente na França. Não há como considerar suas decisões corajosas como determinantes nas formulações e decisões de Lenin e da cúpula dos Bolcheviques, mais de um século depois. Ou vamos esquecer que Lenin era também definido como Jacobino para além de Marxista?
TODAS AS HONRAS a Robespierre, portanto, e Luta que Segue, com seus exemplos